ESTADO ANGOLANO DEVE DEVOLVER PODER USURPADO AS AUTORIDADES TRADICIONAIS

01.06.2023

A exigência foi manifestada quarta-feira,31 de Maio por sobas, séculos e comunidades na reflexão sobre a proliferação de doenças tradicionais vulgo “talas, cadoce-doce e magias nas comunidades locais.

Por: Fonseca Tchingui

Antes da colonização portuguesa, no contexto angolano, as comunidades estavam estruturadas em reinos, ombalas onde os reinados obedeciam a linhagem e as leis serviam para proteger a vida de cada cidadão.

Regedoria do Soba Minguinho no Forte Santa Rita província do Namibe

Os reinados eram respeitados pelo povo, as doenças naturais eram tratadas por terapeutas credíveis e aquelas estranhas eram objecto de investigação e as mortes nas comunidades também eram objecto de investigação e sempre que houvesse excessos por parte daqueles que por obrigação espiritual sacrificavam os sobrinhos, sobretudo, as autoridades tradicionais impunham o seu poder para corrigir estes excessos.

Com a expansão da administração colonial, apesar da resistência em alguns reinos, a verdade porém colonização portuguesa não teria sucesso se não incluísse na sua agenda o pacote de aproximação com as autoridades tradicionais.

Assim, boa parte das autoridades tradicionais perderam a nomenclatura de Reis, soba grandes e passaram a chamar-se regedores e os séculos por anciãos, mas ainda assim esta franja de liderança do povo mantinha os seus rituais, a lei consuetudinária e as formas de tratar os problemas nas comunidades de acordo os parâmetros da cultura de cada povo.

Com o surgimento da Independência a 11 de Novembro de 1975, as armas começaram falar mais alto e o poder das autoridades tradicionais também começou a decair-se.

Nas localidades do país em que não havia reinos e sobados os activistas políticos foram ensaiados para controlar a acção política nas comunidades e depois transformados em soba.

O desconhecimento do poder de um soba foi-se contagiando e por via disso os políticos foram tomando o controlo em benefício do regime que usurpou e nos dias de hoje relegou os sobas sem valor, sem autoridade, passando a ser uma figura decorativa nas comunidades.

O surgimento de doenças estranhas nas comunidades como a Tala, Cadoce-doce, Magia e outros actos espirituais que as autoridades governamentais não conseguem controlar, mas atingem gravemente o povo causando danos humanos, as comunidades têm se levantado contra os sobas grandes exigindo dela responsabilidade na protecção da vida das comunidades.

Em defesa do povo, vários sobas já agiram, já se levantaram-se contra os causadores do sofrimento das comunidades. O mais grave ainda é o facto de muitas das vezes um casal que dorme na cama acorda deitado no chão, casa assaltada com as portas fechadas. As talas postas nas portas de casas, das instituições publicas, outras através do atendimento ao telemóvel “as chamadas minas eléctricas”, com danos fatais se não for tratado a tempo.

Também a venda às mulheres dos pôs “cadoce-doces” com propósito de dar vitalidade a vida sexual ao marido e que mais tarde estimula cessação prazerosa que com um dois ou três parceiros torna-se difícil para uma mulher dai causar conflitos de infidelidades nos lares que terminam em agressões, em separação precoces ou em óbitos, tudo isso tem sido reflectido pelas autoridades tradicionais locais, mas sem solução porque os sobas e séculos dizem que “o governo angolano nos tirou o poder, os órgãos da administração da Justiça nos proíbe fazer justiça nas comunidades”.

“Nós sobas apenas servimos para mobilizar o povo em tempo de eleições, não querem nos devolver a autoridade que provem dos nossos ancestrais”, lamentam os sobas que muito poderiam fazer a favor do povo para diminuir a pressão comunitária sobre as doenças espirituais que advêm do feitiço.

Foi com este espírito e vontade de servir, dando voz aos sem voz, o “Mwangolê Fala Verdade, realizou quarta-feira, 31 de Maio de 2023 um debate na regedoria do Forte Santa Rita, realização e apresentação do jornalista Armando Chicoca, co-produção do Jornalista Esmael Pena e técnica de Fonseca Tchingui, apoio NED e OSISA (Open Society).

PRIMEIRA PARTE-MWANGOLÉ

Foram convidados: o Soba Grande do Namibe, José Manuel Domingos, mais conhecido por “Miguinho”, O soba do bairro dos Eucaliptos Avelino Kapindy, o soba do bairro 4 de Abril Carlos Jerónimo Augusto, o Soba do bairro Boa Esperança Pascoal Likeke e o soba do bairro Yayá Zacarias Inalelé, este último de 93 anos de idade e trinta dos quais no sobado.

Autoridades tradicionais do Namibe

Manuel Cangombe comunicólogo e especialista em assuntos africanos e o terapeuta “das talas” Alfredo Canivete foram os comentaristas deste Mwangolê Fala Verdade que teve uma plateia com mais de uma de uma dezena e meia de entre as vitimas da tala, mulheres que sofreram durante vários anos de patologias tradicionais, testemunhando a odisseia porque passaram.

“Realmente, nós estamos preocupados com a proliferação de talas, que está a vitimar pessoas no Namibe, além das talas, o cadoce-doce, a magia e outras doenças  de fórum tradicional nos tira sono porque o povo grita todos os dias e a nossa actuação tem sido tímida devido a lei que não nos deixa trabalhar a vontade em desrespeito o direito costumeiro” reagiu o soba grande do Namibe Minguinho, descendente da linhagem do soba grande Máquina do século XIX com a Embala no bairro Forte Santa Rita.

“ A tala e a  magia  não sabemos de onde vieram, agora surgiu mais o cadoce-doce, que está destruir lares, está fazer com que as mulheres tenham mais que um marido para a nossa desgraça no Namibe”, manifestou.

Aquela autoridade tradicional disse por outro lado, que os Deputados devem auscultar as preocupações das autoridades tradicionais à semelhança do que fazem com outros sectores da sociedade.

“Nós aqui no Namibe, tinhamos um tipo de doença igual a tala, mas chamava-se de tchiquete, espécie de uma armadilha que se punha na lavra ou noutras coisas para apanhar aquelas pessoas que gostam mexer nas coisas dos outros e, quem fazia isto, eram mais velho, agora a tala até as crianças, no mercado também vendem, nós pedimos aos nossos Deputados  em particular os do Namibe,  que viessem aqui na Embala nos escutarem para falarmos sobre este mal que esta dizimar vidas humanas”, frisou.

O soba grande José Manuel Domingos “Minguinho” defendeu ainda criação de centro de tratamento de doenças tropicais na província o governo do Namibe devia abraçar a bem da população.

Minguinho  defendeu igualmente mais valorização da autoridade tradicional, cujo poder tem sido minimizado pelo direito positivo o que considerou um erro grande porque a policia, a PGR, os tribunais não resolvem o imaterial, não conseguem resolver o que não vê com os olhos.

“Gostaríamos que as autoridades nos dessem liberdade de fazermos o nosso trabalho e agirmos contra estes males que estão afectar as nossas comunidades. O feitiço na verdade existe, muitos dizem que não existe, mas aquilo é só tapar o sol com peneira ou lobo com pele de cordeiro, nós sabemos que isto existe e maior parte dos governantes quando têm problemas ocorrem a ciência oculta “, afirmou.

SEGUNDA PARTE-MWANGOLÊ

“reconhece formalmente mas a autoridade tradicional funcional não é tida e nem achada”

Para o académico Manuel Cangombe, comentarista do painel defendeu a criação do” tribunal tradicional “ a exemplo do que acontece em outros países africanos.

Efeietos negativos da tala

“Os países como Ghana, já é uma realidade, dizer que o governo conhece e reconhece as autoridades tradicionais só, que do ponto de vista funcional não são tidos nem achados, dizer ainda que os nossos deputados sabem que o feitiço existe se o negam é uma questão de cinismo, os africanos tem o feitiço como um dos princípios, é urgente que crie tribunal tradicional para salvaguarda da vida humana”, disse.

O internauta Pedro Bengue, de Luanda, também vítima de tala, é de opinião que o governo deve promover formações dos tratadores de doenças tradicionais enviando-os para os países experimentados na matéria, como a Índia, China, Ghana, entre outros, para capacitá-los e serem mais interventivos no exercício da sua actividade.

“É bom que as autoridades parlamentares trabalhem a pente fino, no sentido de legislar e devolver o poder tradicional. Eu pessoalmente que vos falo, estou com a tala há três anos, já passei na mão de muitos tratadores alguns vindos dos interior do nosso País, Benguela, Kwanza Sul e Moxico que apenas sacaram-me o dinheiro sem ter sido curado”, lamentou.

Alfredo Canivete, é terapeuta tradicional, cito no bairro 5 de Abril, cidade capital do Namibe, mostrou disponibilidade em tratar o internauta do NFV, Pedro Bengue.

“Essas talas são recentes, começaram actuar no Namibe, no ano de 2008, admira-se porque todos municípios, todas as províncias, fala-se de tala, tala, a proveniência desta doença está complicar. Os nossos sobas têm um papel muito importante porque antigamente lá nos matos, no Kimbo para alguém entrar comunidade era levado ao soba para saber o historial desta pessoa. Aqui nas cidades seria também a mesma coisa só que o problema são estes puxa-puxa entre as autoridades tradicionais e o governo.  É preciso que se dê poder aos sobas, para minimizar esta situação as talas são vendidas no mercado. O meu também accionou na tala e quando aqui acabou por morrer por ter chegado tarde ao tratamento.

Para ele quem vende cadoce-doce, este, está destruir casas e lares dos outros, muitas mulheres estão a receber isto, para terem dois a três maridos, por isso é que o nosso apelo quem aparecer a vender isto será severamente punidos pelos nossos sobas”, disse.

Avelino Kapindy é um dos sobas do bairro dos Eucaliptos província do Namibe, que nos últimos dias accionou na tala.

“Aconteceu 1 hora da  noite, na cama me deu pica tipo uma agulha, dali de manhã já não conseguia se levantar, atacou-me no pé esquerdo”, disse.

o soba Augusto João Carlos as talas  não fazem parte das doenças tradicionais da província do Namibe.

“As vezes chamamos alguém para expulsar  dos sobas, mas pessoas  não vêm porque o soba não pode me chamar, o soba não tem esta autonomia, por isso, é que estamos  correndo risco porque nos tiraram o poder”, lamentou.  https://fb.watch/kUenb-9UPm/    https://fb.watch/kUerhhqHyn/

Recentes

NFV FORA D` HORAS 18-09-2024

Noticiário NFV, edição de quarta-feira 18 de setembro de 2024, com os seguintes tópicos: 1 - Governador do Namibe diz que legado de Agostinho Neto é honrado com políticas do Executivo que visam melhoria da vida das pessoas; 2 -  Namibe: Procurador Tadeu Vasconcelos...

NFV FORA D` HORAS 17-09-2024

Noticiário NFV, edição de terça-feira dia 17 de Setembro de 2024 com os seguintes tópicos: 1 - Ordem dos  Advogados de Angola no Namibe denuncia existência de reclusos com penas vencidas nas cadeias locais; 2 - Presidente das Cooperativas de pesca artesanal apela...

pergunta, sugere, denuncia, contribui

Jornalismo com tempo e profundidade faz-se com a tua participação e apoio.

Share This